diário
documentamos os meses que passam com os momentos que os merecem
ler sobre: Há tanto campo em mim
Landra não é só um carvalhal e, quando chegámos, fazia-se já acompanhar de outras árvores que davam ao terreno um ar vibrante. Do outro lado do vale, viam-se apenas prados verdes rasteiros, já quase totalmente despidos, passeando carneiros diariamente. Mas o carvalhal era conhecido como um lugar cheio de copas, e até aprendemos com o senhor Domingos que outrora ali viviam grandes árvores de fruto. A mudança de caseiros deu lugar a limpezas que apresentavam agora a forma de troncos rasantes pelos quais passávamos diariamente nos nossos percursos laborais. Ainda assim, os castanheiros eram consideráveis, e o carvalhal parecia agora mais um olival. Havia várias oliveiras mas nem tantos sinais de azeitonas. Alguns culpavam o tempo, enquanto outros diziam-nos que faltava a poda. A verdade é que não queríamos cortar nada que não fosse estreitamente necessário, mas ao lermos sobre o assunto percebemos que a partir do momento em que as oliveiras são podadas pela primeira vez, o sistema fica de alguma maneira viciado. Já com alguma idade, as oliveiras estavam quase todas, como se diz, a ‘refilar’. Os pequenos ramos que brotavam debaixo do tronco pareciam estar a tomar partido da maior parte da energia, deixando o resto da árvore sem frutificar. Mas ainda se viam sinais de azeitonas em duas ou três, que decidimos tornar na nossa colheita deste ano. Duas ou três, não daria muito a desejar. Mesmo com poucas ferramentas (sem vara nem nada) achámos, pelo menos, que um pano de serapilheira nos ia facilitar a vida, e pusemos então mãos à obra. Uma tarde se passava, com um grande sol de Novembro que mais fazia lembrar Agosto. O Rodrigo em cima duma escada que parecia suspensa no ar, mexia nos ramos para que as azeitonas deles se libertassem e a Sara, cá em baixo, os pudesse apanhar. Azeitona atrás de azeitona, nem meia árvore estava despida e o sol já se punha. Ainda passámos mais alguns serões na apanha antes de as pormos no riacho a demolhar. Pequeninas mas de pele reluzente e tom esverdeado, faziam-nos crer que a nossa singela colheita ia ser bastante proveitosa. De tempo a tempo, a terra ia-se cobrindo de mais azeitonas em cada patamar, mas já não tínhamos mãos a medir, tínhamos mesmo muito para onde nos virar. De repente já não eram só azeitonas que encontrávamos no caminho mas uma panóplia de cogumelos que nunca mais acabava. Nunca tínhamos visto tantos cogumelos diferentes num só lugar. Escuros com manchas claras e claros com manchas escuras, voluptuosos e esguios, peludos e viscosos, parecia uma verdadeiro show de variedades. O problema é que não os sabíamos identificar. Disseram-nos que nos dias que não tínhamos estado no terreno, um senhor tinha andado por lá para os apanhar, mas infelizmente não o encontrámos para que nos pudesse dar uma ajuda. Dizem sempre que até quem sabe não arrisca, mas acreditamos que um dia iríamos conseguir sacar uns grandes petiscos e cozinhados. Parecia-nos ridículo que com tantos cogumelos espalhados, os andássemos a trazer no saco dos comprados. A notícia das maravilhas do campo já se tinha espalhado, e os nossos amigos artistas do Porto, com um quê de vontade de mudar de ares, vieram finalmente visitar-nos para confirmar se a letra ‘há tanto campo em mim’ da Lena D’Água se confirmava. Trouxemo-los pelo caminho da igreja, onde antigamente passavam os aldeões também em dias de funerais, mas aquele belo caminho estava realmente era cheio de vida em cada passo que se dava. A Teresa identificava mais plantas comestíveis enquanto recolhia bocadinhos de musgo, e o Zé falava-nos dos xaropes e cervejas que dariam para preparar. Havia um grande entusiasmo e, apesar de todos concordavam que isto iria dar tudo muito trabalho, confirmaram-nos que estariam sempre prontos a ajudar, pois queriam mesmo lá voltar.
0 Comments
Leave a Reply. |
Autores
Sara Rodrigues Categorias
All
Histórico
May 2024
|